A Quaresma é um tempo de conversão, reflexão e mudança interior. No artigo a seguir, a autora Pamela M. Patnode nos conduz a uma profunda meditação sobre esse período litúrgico, relacionando-o a um evento marcante da história recente da Igreja: a renúncia do Papa Bento XVI. Entre lembranças pessoais e ensinamentos espirituais, o texto convida o leitor a examinar sua própria caminhada de fé e a acolher, com humildade, o chamado à transformação.
Pamela Patnode, Catholic Exchange | Tradução: Equipe Instituto Newman
Este ano, a Quaresma começa em março. No entanto, há doze anos, a Quarta-feira de Cinzas foi em 13 de fevereiro. Lembro-me dessa data por causa do que aconteceu dois dias antes. O dia 11 de fevereiro de 2013 é uma data que teve grande significado para a Igreja e para mim pessoalmente. Naquela época, eu era mãe de alunos que estudavam em casa e era convidada mensal da Relevant Radio, a estação de rádio católica nacional — muitas vezes discutindo tópicos relacionados à educação em casa e à vivência da fé na família. No dia 11 de fevereiro de 2013, eu estava agendada para ser a primeira convidada do dia em um programa matinal da estação de rádio.
O plano para aquela manhã era discutir as práticas da Quaresma para crianças. Mal sabia eu que um evento mundial dramático estava prestes a mudar o curso de nossa discussão. Quando me conectei com a estação antes do início do programa das 6h, a Relevant Radio estava recebendo a notícia de que notícias históricas estavam saindo do Vaticano. Quando começamos a transmitir o programa, o apresentador mencionou que o Papa Bento XVI havia acabado de renunciar ao cargo de Sumo Pontífice. Essa foi a maior notícia que atingiu o mundo católico em séculos, e aqui estava eu, uma mãe que estuda em casa em Minnesota, na rádio católica nacional, a primeira convidada do dia a discutir o assunto. Deus tem um ótimo senso de humor.
Enquanto eu e o apresentador mudávamos nossa conversa no ar para falar sobre essa notícia chocante, os que trabalhavam nos bastidores esforçavam-se para reunir convidados que pudessem discutir esse anúncio importante ao longo do dia. No entanto, como era pouco depois das 6h da manhã, muitos teólogos especialistas, advogados canônicos e estudiosos do papa estavam acordando e ouvindo as notícias. As agendas estavam sendo liberadas, a estação estava mudando a lista de convidados do dia, enquanto o apresentador e eu continuávamos nossa conversa pelos próximos 45 minutos.
Então, o que uma mãe que ensina os filhos em casa tem a dizer na rádio católica nacional quando a maior notícia do mundo católico está acontecendo? Minha mente se acelerou ao pensar nessa pergunta enquanto estávamos ao vivo.
Como nossa conversa mudou de nossa discussão planejada para as notícias de última hora, decidi relacionar os eventos emergentes com partes de uma homilia que havia escutado há muitos anos. O Pe. Arnold Weber, OSB, era um padre e monge beneditino que intitulou uma homilia da Quarta-feira de Cinzas como “A Mudança está no coração da Quaresma”. Como Bento XVI emitiu sua renúncia dois dias antes da Quarta-feira de Cinzas, o tema da homilia do padre beneditino era aplicável quando o mundo católico se preparava para uma mudança inesperada.
Os beneditinos fazem votos que diferem de muitas ordens que aderem aos conselhos evangélicos de pobreza, castidade e obediência. Os beneditinos certamente adotam essas disciplinas, ao mesmo tempo em que seguem os votos estabelecidos na Regra de São Bento. Os votos exclusivos de São Bento incluem obediência (que envolve ouvir a vontade de Deus com o ouvido do coração), estabilidade (que liga o monástico à comunidade na qual ele professa seus votos) e um voto de Conversatio Morum ou “Fidelidade ao modo de vida monástico”, que, de acordo com a Abadia de Conceição, “engloba todos os aspectos da oferta total do monge a Deus”.
A raiz da palavra latina conversatio significa “mudar”. Quando o mundo ficou sabendo das dramáticas notícias papais de 2013, a mudança foi a principal preocupação de muitos no início da Quaresma daquele ano. E, de acordo com o Pe. Weber, o coração da Quaresma é, de fato, a mudança. Em sua homilia, ele apresentou perguntas desafiadoras, perguntas que se aplicam a todos os cristãos batizados ainda hoje. O Pe. Weber disse:
Tradicionalmente, a Quaresma é um período de arrependimento e abnegação. É um momento de fazer um balanço de nossas vidas. Por isso, fazemos algumas perguntas a nós mesmos. . . Se a Quaresma tem a ver com mudança, se a ela tem a ver com transformação, então quão diferentes somos hoje do que, digamos, dez anos atrás?
Ele continuou perguntando se nos tornamos mais pacientes. Ele questionou se ainda guardamos rancores de anos passados. Ele nos desafiou a considerar se havíamos caído da retidão para a justiça própria? Ele então declarou:
Amigos, esse é o cerne do que eu acho que é a Quaresma. Trata-se de mudança. Será que nos tornamos diferentes? Será que nos tornamos mais semelhantes a Cristo? Deixamos entrar mais de Cristo e menos de nós mesmos?”
Ele também observou que “algumas pessoas vão à missa semana após semana e ano após ano e nunca mudam. A Quaresma nos dá a oportunidade de quebrar esse ciclo.”
Ao refletir sobre minhas práticas quaresmais para este ano, as perguntas do Pe. Weber permanecem em minha mente. O que farei para me aproximar intencionalmente de Cristo e me tornar mais semelhante a Ele?
Quando considero os pilares quaresmais da oração, do jejum e da esmola, sou desafiada a conectá-los aos frutos do Espírito Santo. Que práticas de oração posso empregar para me ajudar a crescer em fidelidade, gentileza, paz e bondade? Que práticas de jejum me levarão a crescer em modéstia, paciência, castidade e autocontrole? E como a minha esmola pode me ajudar a crescer em generosidade, bondade, caridade e alegria?
Ao olhar para trás, para os eventos dignos de notícia de 2013, lembro-me de que a mudança é inevitável. Os eventos mundiais continuarão a evoluir, ocorrerão flutuações familiares e transtornos pessoais. Temos pouco controle sobre esses eventos.
Entretanto, a conversatio de nossos corações é algo que somos convidados a abraçar com intenção, sacrifício e esforço. Nos doze anos que se passaram desde aquela transmissão de rádio ao vivo anunciando uma mudança histórica para a Igreja, muita coisa aconteceu. Meus filhos cresceram e estão começando suas vidas adultas e suas próprias famílias, os eventos mundiais continuaram a se desenvolver.
E, sim, a Quaresma chegou novamente. Mais uma vez, somos convidados a abraçar a mudança, a nos submetermos humilde e obedientemente à conversão e a ouvir com os ouvidos do coração a voz de Deus em nossas vidas. Que possamos fazer isso com fé, esperança, amor e alegria.
São Bento, rogai por nós.
A Autora
Pamela M. Patnode é uma oblata beneditina, autora, palestrante, líder de retiro e educadora. Patnode tem mestrado em Teologia, doutorado em Educação.